O
nascer do século 20 foi como uma aurora resplandecente. O nível de expectativa era
inédito. Tanto havia sido conquistado no século anterior que parecia sensato
acreditar que dali em diante os êxitos do mundo em muito superariam os
desastres.
O
século que nascia representava uma promessa especial para os povos europeus,
quer habitassem o Velho Mundo ou as longínquas terras colonizadas. Seus
filhos poderiam esperar uma educação melhor do que nunca, e o trabalho de
crianças de 10 anos em tempo integral, em fazendas e oficinas, já não parecia
normal. A vida melhorava, a fome diminuía, as pessoas viviam mais. Os
conflitos entre as principais nações da Europa pareciam se extinguir, embora tropas
numerosas ainda desfilassem em feriados nacionais. Democracia e liberdade se
espalhavam. No entanto, a maior parte de tais benefícios atingia apenas um
quarto da população mundial e não parecia provável que chegasse à África, à
Ásia ou às remotas ilhas do Pacífico.
O
século se iniciava de modo promissor e ao mesmo tempo perigoso. A aurora de
1901 se anunciava esplendorosa, mas nuvens negras, em lenta caminhada, pairavam
acima da luz.
A
Europa dominava uma grande porção do mundo. A maior parte da frota mundial de
navios mercantes ou de guerra navegava sob bandeira britânica, alemã ou
francesa. O continente concentrava algumas das maiores cidades do mundo, com
seus palácios e museus, suas galerias de arte e universidades. As estradas de
ferro e linhas telegráficas, em sua maioria, eram construídas ou financiadas
por companhias europeias. Quase todas as grandes ilhas eram províncias ou
colônias da Grã-Bretanha, da Holanda, da França, de Portugal, da Espanha ou da
Alemanha. Faltava pouco para a África e as ilhas do Pacífico estarem todas
sob domínio europeu. Na Ásia, os únicos grandes países não colonizados pela
Europa eram a China e o Japão.
O
Império Britânico, o maior conhecido pelo mundo até então, ainda não havia
atingido seu auge, mas já era dono de uma parcela significativa de cada
continente habitado e de uma série de ilhas em cada oceano. No ano de 1900,
dominava os mares, com barcos carvoeiros no Mar do Norte, navios de passageiros
rumo a portos distantes e embarcações sem rotas estabelecidas, com “suas
chaminés cobertas de sal”. O Império Britânico e a China tinham, cada um,
aproximadamente 400 milhões de habitantes, abrigando, em conjunto, metade da
população mundial.
Em
evolução - portanto desordenado -, esse império contrastava com todos os
anteriores. Em algumas colônias, os representantes britânicos eram extremamente
poderosos, enquanto em outras não passavam de imponentes figuras decorativas.
No Egito, os oficiais britânicos de maior patente tomavam as decisões, mas
permitiam que altivos paxás continuassem a fumar suas cigarrilhas em suntuosos
escritórios, em uma demonstração de prestígio. Por outro lado, Canadá,
Austrália e Nova Zelândia dispunham de grande autonomia, e seus parlamentos
representavam mais fielmente o povo do que o parlamento britânico. Em termos de
política internacional, porém, não eram independentes. No entanto, a mãe dos
parlamentos, às margens do Tâmisa, considerando os acontecimentos que levaram à
independência das colônias americanas no século 18, de vez em quando se
permitia ser desafiada ou ignorada por essas colônias, quando se tratava de
questões de política externa de importância vital para elas, que cada vez mais
financiavam os próprios exército e marinha, embora aceitassem a liderança
britânica em caso de guerra. Em situação diametralmente oposta, estavam as
colônias da África e da Ásia, que não possuíam parlamento, juízes locais ou
oficiais de alta patente e dependiam em grande parte, em termos econômicos, da
Grã-Bretanha.
O
crescimento do Império Russo se deu de forma tão acelerada que ficou difícil
diferenciar, nos mapas, a velha Rússia do novo império. O Império Russo se
estendeu desde o Mar Báltico até o Oceano Pacífico. De tão vasto, em uma
extremidade fazia fronteira com a Turquia e a Pérsia, enquanto na outra
encontrava a divisa da Coreia. Em tamanho, somente o Império Britânico o
excedia.
Um
indício de quanto essa parte do Império Russo era recente: até 1860, a bandeira
russa não tremulava em portos tão distantes como o de Vladivostok, no Oceano
Pacífico, ou o de Batumi, no Mar Negro. Aos poucos, a ferrovia transiberiana se
estendia para o leste, chegando ao Lago Baikal, na Sibéria, no início do
século, e logo atingindo o Oceano Pacífico. Diante de tal abrangência, alguns
observadores imaginaram que aquele seria o século russo.
A
Alemanha era um império mais jovem. As terras que, em 1880, não passavam de
alguns pontos no mapa transformaram-se em atraentes peças de um quebra-cabeça.
Soldados, administradores, missionários e mercadores alemães haviam ocupado
partes das costas oeste e leste da África, a Nova Guiné e uma série de ilhas
nas cercanias. No outro lado do Oceano Pacífico, próximo à linha do Equador,
estavam a Samoa alemã e a Nauru alemã, bem como outros postos avançados.
Algumas colônias ficavam tão distantes que um inspetor de Berlim, ao fazer a
visita anual aos escritórios de correios dos territórios alemães, usando
somente os navios do serviço postal, poderia levar até oito meses para passar
por todos eles. Uma vez que a Alemanha havia se tornado uma potência colonial,
era necessário que formasse uma marinha de guerra - e essa poderosa força naval
foi fator de instabilidade na Europa durante os primeiros anos do século.
A
França era um império mais antigo, fruto de mais de trezentos anos de
colonização. Depois da Grã-Bretanha, era o império mais disperso. Compreendendo
a Indochina tropical e territórios remanescentes de colônias nas Américas do
Norte e do Sul, o Império Francês detinha grande parte da África, incluindo uma
série de províncias na costa sul do Mediterrâneo. Suas ilhas no Pacífico se
estendiam desde a Nova Caledónia, uma das principais jazidas de níquel do
mundo, até o exótico Taiti. Em termos de área, tinha somente a metade do
tamanho do Império Russo, mas alcançava todos os grandes oceanos do mundo.
Talvez não passasse de 20 o número de cidadãos franceses que já haviam
visitado todas as colônias habitadas pertencentes a seu país. Tal declaração
pode ser feita com boa dose de certeza, uma vez que a ilha dos baleeiros de
Kerguelen jazia em total isolamento nos agitados mares do sul do Oceano Índico.
Um
vasto império que muitos acreditavam estar à beira da ruína era o Otomano. Com
governo sediado em Constantinopla, fazia fronteira com o Mediterrâneo, o Mar Negro,
o Mar Vermelho e o Golfo Pérsico. Havia séculos que ameaçava cair, e seu
enfraquecimento viria a determinar a eclosão da Primeira Guerra Mundial.
A
China, pródiga em recursos, parecia adormecida, enquanto diplomatas e
negociantes europeus a cobiçavam. A mais populosa nação do mundo corria o risco
de ser alvo de negociação por parte de potências estrangeiras que pretendiam
dividi-la. Derrotada pelo refeito Japão na guerra de 1894-95, permanecia
intacta graças, em boa parte, a sua sorte. Em resumo, as ambiciosas nações europeias
e os Estados Unidos não conseguiram chegar a um acordo sobre a anexação e o
controle do território chinês. Portos chineses, como os de Xangai, Macau e Hong
Kong, já estavam sob o controle da Europa, e Taiwan havia sido recentemente
anexado pelo Japão.
Tais
impérios europeus pareciam poderosos em 1900 e continuavam ávidos por expansão.
Tudo entraria em colapso ao longo do século.
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