sexta-feira, 28 de abril de 2017

O MUNDO NA ÉPOCA DE SAINT-EXUPÉRY - PARTE 2



            Os europeus mais atentos - uma minoria - previram as consequências para a Europa do papel exercido pelos Estados Unidos, tanto política quanto militarmente. Por volta de 1900, o país chegava à marca de 80 milhões de habitantes, cerca de 20 milhões a mais do que a Alemanha. Na produção de aço - o barômetro econômico da época -, era o líder mundial. Em outros produtos, de tabaco a minerais, era o maior ou o segundo maior produtor. Às vésperas da Primeira Guerra Mundial, seus produtos manufaturados alcançavam a quantidade total produzida pela Grã-Bretanha, Alemanha e França juntas.

            Os Estados Unidos eram o centro da criatividade, fosse em forma de religião, como a ciência cristã, fundada por Mary Baker Eddy, ou em forma de música, como o jazz, criado por afrodescendentes. Nova York era a capital mundial da novidade. The House ofMirth, romance de Edith Warthon publicado em 1905 (lançado mais tarde no Brasil com o título A Casa da Alegria), começa com a descrição de uma elegante mulher que deixa a agitação de fim de tarde na Grand Central Station - uma das visões mais fascinantes do mundo - e dirige-se a ruas onde se encontram belas casas de tijolos e pedras, decoradas com floreiras e toldos, tudo “fantasticamente variado, de acordo com a ânsia americana pela modernidade”.

            Lá também surgiam novas palavras e expressões. Lá se encontravam os mais altos edifícios comerciais do mundo, as mais extensas linhas ferroviárias e grandes minas de carvão que ameaçavam suplantar a Grã-Bretanha na extração do mineral. Os Estados Unidos eram os líderes em engenharia elétrica, fornecendo mão de obra e

             equipamentos para a construção das linhas do metrô de Londres no início do século. O índice de crianças europeias alfabetizadas era inferior ao de crianças norte-americanas, e um soberbo núcleo de universidades tomava forma na América. Apesar de não possuírem uma tradição histórica em artes visuais, os Estados Unidos a compravam com dólares. Pinturas famosas discretamente deixavam os castelos e palácios europeus para, depois de leiloadas em Londres, aparecerem em galerias particulares de magnatas do aço e das estradas de ferro, como os Carnegies e os Fricks.

            Os Estados Unidos haviam se tornado um império, embora os cidadãos, em sua maioria, não se sentissem donos dele. O país possuía o Alasca, negociado com a Rússia no ano de 1867; possuía o Havaí; havia derrotado a Espanha em uma rápida guerra, conquistando temporariamente Cuba e as Filipinas, e aumentava a marinha de guerra, a fim de acompanhar sua expansão territorial. Um dos emocionantes eventos de 1908 foi a viagem de uma grande esquadra desarmada para as distantes costas do Pacífico, onde seus marinheiros marcharam à vontade pelas ruas - diferentemente da formalidade europeia -, para deleite das multidões. Essa elegante esquadra, de proporções até então inéditas no Oceano Pacífico, foi uma espécie de aviso ao Japão, no entender de alguns observadores. Em 1914, a marinha de guerra norte-americana já era a terceira maior do mundo, contrastando com o diminuto exército.

            Os Estados Unidos, que tinham até então preferido viver em isolamento - a ponto de seus esportes favoritos, como o beisebol e o futebol americano, terem sido inventados lá mesmo - começaram a olhar para fora. Iniciava-se o planejamento do Canal do Panamá, que colocaria a América do Norte no centro da rota de comércio global. Em 1900, o país enviou tropas para o norte da China, a fim de se juntarem a outros exércitos de diversas nações e assim restabelecer a ordem após a Rebelião dos Boxers, de cunho antiocidental e anticristão. Cinco anos mais tarde, em seu próprio território, a nação liderou as delicadas discussões que puseram termo à guerra entre Rússia e Japão.

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