sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

“É preciso muita paciência, não para agarrá-la, mas sim para amá-la”.

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“Quando, me perguntavam, quando é que acabará a guerra? Também gostaríamos de compreender as coisas. Já é tempo de voltarmos...”
Se, uma vez por outra, algum deles capturava uma raposa das areias ainda pequena e que comia nas suas mãos, ou gazelas que condescendiam em não morrer, as alimentavam, e a raposa das areias a cada dia ia ficando mais valiosa ao se enriquecer de pelos sedosos, de animação e principalmente da necessidade de alimento que tão imperiosamente exigia a bondade do guerreiro. E ele vivia na ilusão inútil de fazer passar algo de seu para o animalzinho, como se este fosse alimentado, formado e composto pelo seu amor.
Até que um dia a raposa que ele amava fugia pela areia e esvaziava de repente a alma do homem. Houve um que vi morrer por não ter se defendido durante uma emboscada. E me veio à memória, quando recebemos a notícia da sua morte, a frase misteriosa que ele tinha dito depois da fuga da sua raposa, quando os companheiros o sentindo melancólico lhe tinham sugerido que capturasse uma outra: “É preciso muita paciência, não para agarrá-la, mas sim para amá-la”.
No entanto eles já se sentiam cansados das raposas e das gazelas, pois viam que as suas trocas eram vãs: uma raposa que fugia do seu amor não enriquecia para eles o deserto.
“Eu tenho filhos, dizia-me outro, e eles estão crescendo sem que eu os tenha criado. Nada de meu vou depositando neles. E para onde irei quando morrer? ”

E eu os encerrava no silêncio do meu amor, vendo o exército que começava a se dissolver na areia e lá se perder como esses rios nascidos das tempestades que o subsolo de argila não consegue salvar e morrem estéreis, sem sequer ao longo das margens se terem mudado em árvores, em capim, em alimento para os homens.
O meu exército desejara mudar-se em oásis pelo bem do império, para embelezar o meu palácio de residências longínquas, para quando falassem dele, poderem dizer: "Que diferentes são ao sul essas palmeiras, esses palmeirais novos, essas aldeias em que se esculpe o marfim...”
Mas nós combatíamos sem ânimo e cada um de nós pensava no regresso. E a imagem do império se destruía neles como um rosto para o qual já não sabemos olhar e deixamos perder na desordem do mundo.
“Que nos importa, diziam eles, possuir ou não este oásis desconhecido? O que ele nos acrescenta? Em que ele nos engrandece? Quando, voltando para casa, nos fecharemos na aldeia? O oásis servirá apenas para quem lá ficar morando, ou colhendo as tâmaras das suas palmeiras, ou lavando roupa na água viva dos seus riachos...”



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