quarta-feira, 12 de julho de 2017

O PEQUENO PRÍNCIPE - 14

             XIII

            O quarto planeta pertencia a um homem de negócios. Ele estava tão ocupado que sequer levantou a cabeça quando o pequeno príncipe chegou.



             "Bom dia”, disse o pequeno príndpe. "O seu cigarro já se apagou.”

            "Três e dois dão cinco. Cinco mais sete dá doze. Com doze mais três, temos quinze... Bom dia... Quinze e sete dão vinte e dois. Vinte e dois mais seis dá vinte e oito... Ainda não tive tempo de acendê-lo novamente... Com vinte e seis mais dnco, temos trinta e um. Ufa! Então isso tudo dá um total de quinhentos e um milhões, seiscentos e vinte e dois mil, setecentos e trinta e um.”

            "Quinhentos milhões do quê?”

            "Hã? Você ainda está por aí? Quinhentos e um milhões de... Não, eu não posso parar... Tenho tanto por fazer! Estou preocupado com os assuntos sérios, não perco tempo com disparates e besteiras... Dois e cinco dão sete...”

            "Quinhentos milhões do quê?”, repetiu o pequeno príndpe, que jamais em sua vida deixou uma questão em aberto.

            O homem de negócios levantou a cabeça:

            "Durante os cinquenta e quatro anos em que morei neste planeta, só fui incomodado três vezes. A primeira foi há vinte e dois anos atrás, quando um ganso enorme caiu sabe-se lá de onde. Ele fazia um barulho terrível que ecoava por todos os cantos, e eu cometi quatro erros nas minhas contas.

            A segunda vez foi há onze anos, por uma crise de reumatismo. Sabe como é, falta de exerddo, e eu não tenho tempo algum para passeios.

            A terceira vez... Bem, esta é a terceira vez! Como eu ia dizendo, quinhentos e um milhões..."

            “Milhões do quê?”

            O homem de negócios logo percebeu que não havia esperança alguma de ser deixado em paz enquanto não respondesse aquela questão:

            “Milhões dessas coisinhas que as pessoas às vezes veem pelo céu.”

            “Moscas?”

            “Oh, não. Coisinhas brilhosas.”

            “Abelhas?”

            “Oh, não. Essas coisinhas douradas que causam sonhos aos desocupados e aos preguiçosos. Já quanto a mim, sou um sujeito preocupado com os assuntos sérios. Em minha vida não há tempo para essas divagações inúteis.”

            “Ah! Você quer dizer, as estrelas?”

            “Sim, isso mesmo. As estrelas.”

            E o que você faz com quinhentos milhões de estrelas?”

             "Quinhentos e um milhões, seiscentos e vinte e dois mil, setecentos e trinta e um. Eu me preocupo bastante com os assuntos sérios, por isso, gosto de ser exato."

            "E o que você faz com essas estrelas?"

            "O que faço com elas?"

            "Sim."

            "Nada. Eu sou o seu dono.”

            "Você é dono das estrelas?"

            “Sim."

            "Mas eu acabo de visitar um rei que..."

            "Os reis não possuem as coisas, eles somente reinam sobre elas. É algo muito diferente."

            "E para que lhe serve possuir as estrelas?”

            "Ora, serve para que eu seja rico.”

            "E para que lhe serve ser rico?”

            “Ser rico me dá a possibilidade de comprar mais estrelas, acaso alguma nova estrela seja descoberta.”

             "Esse sujeito", pensou o pequeno príncipe consigo mesmo, “pensa de uma forma muito parecida com a do pobre bebum..."

            Em todo caso, ele ainda tinha mais perguntas a fazer

            “Como é possível que alguém seja dono das estrelas?"

            “A quem elas pertencem?”, replicou o homem de negócios, meio aborrecido.

            “Eu não sei. Acho que a ninguém."

            “Então elas pertencem a mim, pois fui eu a primeira pessoa quem pensou em ser dono delas."

            "Isso é tudo de que precisa?"

            "Certamente. Quando você encontra um diamante que não pertence a mais ninguém, ele é seu. Quando você descobre uma ilha que não pertence a mais ninguém, ela é sua. Quando você tem uma ideia antes de todo mundo, você a registra e cria uma patente: ela é sua.

            Então, no meu caso, eu possuo as estrelas porque ninguém nunca pensou nisso antes de mim."

            "Sim, é verdade. Mas então, o que você faz com elas?"

            "Eu as administro. Eu faço a sua contagem, e então a recontagem. É difícil, eu sei, mas eu sou um homem naturalmente inclinado para os assuntos sérios.

            O pequeno príncipe ainda não se deu por satisfeito:

            “Se eu tivesse um cachecol de seda, eu poderia enrolá-lo em volta do meu pescoço e o levar comigo. Se eu tivesse uma flor, eu poderia colhê-la e a carregar comigo. Mas você não pode colher as estrelas do céu.

            “Não, mas eu posso colocá-las no banco.“

            “O que isto significa, ‘colocá-las no banco?"

            “Isto significa que eu anoto a quantidade de estrelas que possuo num papelzinho. Então eu coloco o papelzinho numa gaveta e a tranco com uma chave.”

            "E isso é tudo?”

            “É o suficiente”, respondeu o homem de negócios.

            "É divertido”, pensou o pequeno príncipe. "É até mesmo poético, mas não é algo assim tão sério.”

            As ideias do pequeno príncipe acerca dos assuntos sérios eram um tanto diversas das ideias das pessoas grandes.

            "Já eu possuo uma flor”, ele continuou a conversa com o sujeito, "que rego todos os dias. Também possuo três vulcões, que tenho de limpar toda semana (e eu também limpo o que está inativo, pois nunca se sabe). Para os vulcões, eu sou de alguma utilidade. Para a minha flor, também é bom que eu seja o seu dono. Mas você não tem utilidade alguma para as estrelas..."


            O homem de negócios abriu sua boca, mas não encontrou nada com o que respondê-lo. E assim, o viajante pequenino decidiu prosseguir sua jornada.



            "As pessoas grandes são certamente extraordinárias", ele dizia a si mesmo, enquanto continuava sua viagem.

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