segunda-feira, 24 de julho de 2017

O PEQUENO PRÍNCIPE - 16

 XV

            O sexto planeta era dez vezes maior do que o último. Nele morava um senhor bem velhinho que escrevia livros gigantescos.


             "Ora, vejam! Aqui está um explorador!", exclamou o ancião assim que avistou o pequeno príncipe se aproximando.

            O viajante pequenino se sentou um pouco sobre a mesa, ofegante. Afinal, ele já havia viajado por tanto tempo, e tão longe!

            "De onde você vem?”, perguntou o ancião.

            “O que é este livro enorme?", disse o pequeno príncipe. “O que está a fazer por aqui?"

            “Eu sou um geógrafo."

            "O que é um geógrafo?”

            "Um geógrafo é um estudioso que conhece a localização de todos os mares, rios, cidades, montanhas e desertos.”

            “Isto é bem interessante”, disse o pequeno príncipe, e logo pensou consigo mesmo, "Finalmente encontrei um sujeito que tem uma profissão de verdade!”.

            E lançou um olhar sobre o ancião e o seu planeta... Era o planeta mais magnífico e imponente que já tinha visto.

            "O seu planeta é belíssimo", elogiou. "Ele tem algum oceano?”

            "Não poderia lhe dizer”, respondeu o geógrafo.

            Ah!”, o pequeno príncipe estava um pouco desapontado. "Mas ele tem montanhas?”

            “Não poderia lhe dizer.”

            "E cidades, rios, desertos quem sabe?”

            'Tampouco poderia lhe dizer sobre nada disso...”

            "Mas você é um geógrafo!"

            “Exato, mas eu não sou um explorador. Eu não tenho um único explorador aqui em meu planeta... Não cabe ao geógrafo sair para contar as cidades, os rios, as montanhas, os mares, os oceanos ou os desertos. O geógrafo é alguém muito importante para ficar passeando por aí - ele jamais abandona a sua mesa de estudos.

            Mas também cabe a ele receber a visita dos exploradores para que eles auxiliem em suas pesquisas. O geógrafo faz a eles uma série de perguntas, e vai anotando tudo o que eles se lembram de suas viagens. E assim, se as lembranças de um explorador em específico lhe parecerem dignas de nota, o geógrafo organiza um inquérito para que possa determinar o caráter moral do explorador.”

            "E para que precisa disso?”

            "Porque um explorador mentiroso traria informações erradas, o que seria um desastre para os livros do geógrafo. Um explorador que bebesse demais, por exemplo, também seria descartado.”

             “Porque?"

            “Porque homens embriagados veem tudo em dobro. Assim, o geógrafo iria anotar que existem duas montanhas num local onde, na realidade, existe somente uma."

            “Bem, eu conheço alguém que daria um mau explorador..."

            “E possível Bem, e quando o caráter do explorador aparenta ser bom, fazemos uma investigação sobre a sua descoberta."

            “Vocês vão até lá ver?"

            “Não, isto seria algo muito complicado. Mas requisitamos que o explorador nos forneça provas. Por exemplo, se a descoberta em questão é uma grande montanha, requisitamos que o explorador nos traga grandes pedregulhos de lá."

            0 geógrafo subitamente começou a ficar bem entusiasmado:

            "Mas você, você vem de bem longe! Você é um explorador! Você deve descrever o seu planeta para mim!”

            E, tendo aberto o seu gigantesco livro de registros, o geógrafo começou a apontar seu lápis. As narrações dos exploradores são primeiramente registradas a lápis. Somente após o fornecimento de provas nas investigações das descobertas é que os registros são refeitos a caneta.

             “E então?", perguntou o geógrafo, ansioso pelo relato.

            “Bem, onde eu moro não há nada de tão interessante. É um planeta bem pequenino. Eu tenho três vulcões, dois deles ativos e outro inativo. Mas nunca se sabe quando o terceiro voltará à atividade.”

            “Nunca se sabe", concordou o ancião.

            “E também tenho uma flor."

            “Nós não fazemos registros de flores", disse o geógrafo.

            “E por que isso? A minha flor é a coisa mais bela do meu planetinha!"

            “Nós não mantemos registros delas simplesmente porque são efêmeras."

            “O que isto significa, 'efêmera’?

            “Ora, os tratados de geografia são, dentre todos os demais livros, aqueles que mais se preocupam com as coisas sérias e permanentes. Assim, eles nunca saem de moda. E muito raro que uma montanha mude de posição, assim como é raríssimo que um oceano seque totalmente. Nós só mantemos registros das coisas duradouras e eternas..."

            Mas vulcões inativos ainda podem voltar a ter erupções" interrompeu o pequeno príncipe. "E o que significa “efêmera”?

            “Se os vulcões estão ativos ou inativos, para nós tanto faz. O que nos importa é saber da posição da montanha. É a montanha que não muda de lugar."

            “Pois então, mas o que afinal significa aquilo que disse, ‘efêmera’?, insistiu o pequeno príncipe, que nunca em sua vida deixara uma questão em aberto.

            "Significa ‘estar ameaçada de desaparecer em breve'."

            "A minha flor está ameaçada de desaparecer em breve?"

            "Certamente está.”

            “Minha flor é efêmera", concluiu para si mesmo o pequeno príncipe, “e ela possui somente quatro espinhos para se defender dos perigos do mundo. E eu a abandonei em meu planeta, sozinha!"

            Este foi o seu primeiro momento de arrependimento. Mas logo retomou a coragem:

            “Que lugar você me aconselharia a visitar a seguir?"

            “O planeta Terra", respondeu o geógrafo. “Ê um planeta de boa reputação."


             E assim o viajante pequenino prosseguiu em sua jornada, pensando em sua flor.

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