A
fama e o dinheiro obtidos com o sucesso de Terra
dos Homens não conseguiram dissipar as angústias e dúvidas de Saint-Exupéry,
embora ele passasse a ser reconhecido como um dos maiores escritores de uma das
idades de ouro da literatura francesa. A Academia Francesa outorgou-lhe o
Grande Prêmio na categoria romance por Terra
dos Homens, enquanto Wind, Sand and
Stars obtinha um enorme sucesso nos Estados Unido s. Durante seis meses,
entre março e setembro de 1939, foi ovacionado nos dois lados do Atlântico, e
suas preocupações financeiras desapareceram praticamente da noite para o dia.
No entanto, seus tormentos não cessaram. O mínimo detalhe o impressionava, como
resumiria numa carta de Nova York a uma amiga jornalista, Sylvia Hamilton, após
a capitulação da França. Ele lhe contava como o cansaço e a distração faziam-no
perder seus trens e faltar a seus encontros, perder endereços, esquecer
telefonemas, ofender os amigos com os quais depois tinha dificuldade de se
reconciliar. Esses problemas impediam-no de escrever e até mesmo tinham-no
feito aceitar três convites para jantar no mesmo dia.
Os
seis meses anteriores a seu alistamento como capitão na aeronáutica, em
setembro de 1939, foram extremamente agitados. Esse período, durante o qual fez
duas viagens aos Estados Unidos, foi sem dúvida o mais estressante de sua
existência. Numa dessas viagens, reencontrou Henri Guillaumet, que continuava
sendo piloto da Air France nas linhas atlânticas. Embora não tivesse tornado a
voar desde o acidente na Guatemala, Saint-Exupéry persuadiu a companhia a
deixá-lo voar com o amigo na qualidade de observador, numa tentativa de recorde
de travessia do Atlântico a bordo de um novo hidravião de seis motores da
Latécoère, o Lieutenant de Vaisseau Paris.
Entre os oito membros da tripulação encontrava-se o operador de rádio do
período africano, Jacques Néri.
O
avião decolou de Biscarosse, perto de Bordeaux, e fez escala, em 7 de julho,
nas ilhas Açores. Depois disso Saint-Exupéry passou quatro dias em Nova York
visitando as livrarias que vendiam há dez dias Wind, Sand and Stars. No dia 14 de julho, saindo dos Estados Unidos
para a Europa, o hidravião foi beneficiado com ventos favoráveis, que
permitiram que fosse estabelecido um recorde de travessia do Atlântico, em 28
horas sem escala.
Alguns
dias após seu regresso à França, Saint-Exupéry retornava a Nova York para a
promoção de Wind, Sand and Stars, que
fora escolhido o melhor livro do mês. Viajou no navio Normandie e, durante a noite de 28 a 29 de julho de 1939, outro
aparelho da Air France, o Ville de
Saint-Pierre, escoltou o navio durante diversos quilômetros, voando a baixa
altitude acima do convés, enquanto as luzes do barco eram ligadas e desligadas
para saudá-lo. O piloto, naturalmente, era Guillaumet, que enviou uma mensagem
de saudação a Saint-Exupéry; este respondeu pelo rádio, demonstrando sua admiração
pela tripulação do hidravião. Esta foi a última vez que os amigos partilharam
uma aventura aérea.
O
fato de Saint-Exupéry ser espectador no convés de um navio, enquanto Guillaumet
voava majestosamente sobre ele, resume muito bem os destinos divergentes dos
pilotos. Saint-Exupéry nunca mais seria aviador profissional, enquanto
Guillaumet, apenas dois anos mais moço que ele, prosseguia uma das mais brilhantes
carreiras de piloto de linha.
Em
Nova York, Saint-Exupéry resignou-se a um planejamento rígido para o lançamento
de seu livro, com entrevistas e autógrafos, porém essa visita também
permitiu-lhe encontrar-se com o pioneiro da aviação americana, Charles
Lindbergh, e sua esposa, Anne Morrow Lindbergh, de quem Saint-Exupéry
prefaciara um dos livros publicados em francês, Le Vent se Lève. Anne Lindbergh descreveu em seu diário a primeira
impressão física do rosto de Saint-Exupéry, impenetrável, quase eslavo em sua
solidez, com olhos levemente puxados.
Saint-Exupéry
revelou ser um contador de histórias tão brilhante que Charles Lindbergh,
geralmente muito meticuloso, ficou sem combustível na estrada enquanto escutava
suas experiências de voo. Saint-Exupéry falava apenas francês, deixando a Anne
Lindbergh a tarefa de traduzir da melhor forma possível para o marido.
“Os
relatos jorravam de seus lábios como flores monstruosas que nos deixavam
fascinados, esquecendo o lugar onde estávamos ou aquilo que fazíamos”, escreveu
ela. Saint-Exupéry também evocou detalhadamente seu amor pela Provence,
convidando os Lindbergh a visitá-lo; mas a tensão com a aproximação da guerra
era tão evidente que Anne Lindbergh anotou em seu diário que estava consciente
de viver “um interlúdio de sonho”, certa de que o convite não se concretizaria.
“Nunca o revimos, mas devido a esse breve interlúdio às vésperas das
hostilidades, Saint-Exupéry transformou-se para mim na lente através da qual eu
via a guerra”, acrescentou.
Apesar
dos novos amigos e de um ritmo frenético, Saint-Exupéry não quis permanecer
muito tempo longe da Europa. Após diversos telefonemas a amigos na França,
abreviou sua visita e embarcou rumo ao Havre, em 20 de agosto, no navio Ile-de-France,
convencido, com razão, da iminência da guerra.
Nenhum comentário:
Postar um comentário