segunda-feira, 12 de junho de 2017

CIDADELA - 9

É também por isso que encerro a mulher no casamento e mando lapidar a esposa adúltera. E na verdade compreendo muito bem a sua sede e a importância da presença que reivindica. Consigo entender, ela apoiada no parapeito do terraço, quando a noite permite milagres, cercada por todos os lados pelo mar alto do horizonte, e entregue, como a um carrasco solitário, ao suplício de ser terna.

            Eu a sinto toda palpitante, lançada ali como uma truta sobre a areia, e que espera, como a plenitude da vaga marinha, o manto azul do cavaleiro. Todo o seu apelo o deixa cair na noite. Há de surgir alguém disposto a satisfazê-la. Mas em vão ela passará de manto em manto, porque não existe homem que a satisfaça. A praia, para se refrescar, chama pelas vagas do mar e as vagas se sucedem eternamente. Gastam-se umas atrás das outras. Não adianta ratificar a mudança de esposos: Quem ama acima de tudo a proximidade do amor, jamais conhecerá o encontro...

            Só estou disposto a salvar aquela que aceita se arrumar em volta do pátio interior, tal como o cedro se edifica em volta de sua semente, e encontra em seus próprios limites seu desenvolvimento. Estou disposto a salvar aquela que, em vez de amar a primavera, ama a ordem desta ou daquela flor em que a primavera se encerrou. Que não ama o amor, mas sim este ou aquele rosto particular que contraiu o amor.

            É por isso que essa esposa dispersa na tarde a expurgo ou a congrego. Disponho à sua volta, como outras tantas fronteiras, o fogareiro, a cafeteira e a bandeja de cobre, para que pouco a pouco, através deste conjunto, ela venha a descobrir um rosto conhecido, familiar, um sorriso que só pode ser daqui. E isto significará para ela a aparição lenta de Deus. A criança então gritará para mamar, a lã a tecer constituirá uma tentação para os dedos, e a brasa exigirá a sua parte de sopro. Então ela será capturada e pronta para servir. Porque sou aquele que constrói a urna em volta do perfume, para que ele permaneça. Sou o tempo que amadurece o fruto. Sou aquele que constrange a mulher a assumir feições e a existir, para que mais tarde eu possa remeter em seu nome a Deus, não este leve suspiro disperso no vento, mas uma certa devoção, determinada ternura, tal sofrimento particular...


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