Elizeth Moreira Cardoso (Rio de Janeiro, 16 de julho de 1920 — 7 de maio de 1990) foi uma cantora brasileira. Conhecida como A Divina, Elizeth é considerada uma das maiores intérpretes da música brasileira, além de um das mais talentosas cantoras de todos os tempos, reverenciada pelo público e pela crítica nacional e internacional.
Elizeth
Moreira Cardoso nasceu num cortiço na rua Ceará nº 05, no subúrbio de São Francisco Xavier, próximo ao Morro da Mangueira.
Oriunda de uma família bastante humilde, tinha o sonho de ser artista, e era
levada pelo pai para cantar pelos bairros da zona norte carioca, cobrando
ingresso (10 tostões) das outras crianças para ouvi-la cantar os sucessos de Vicente Celestino. O pai, Jaime Moreira
Cardoso, era seresteiro e
tocava violão, e levava a filha em suas
apresentações. A mãe de Elizeth, Maria José Pilar, era dona de casa e gostava
de cantar. Elizeth possuía cinco irmãos: Jaimira, Enedina, Nininha, Diva e
Antônio. A família frequentava casa de sambas e festivais de música popular na
cidade, além de conviver com grandes músicos na casa de Tia Ciata, amiga de seus pais e de seus
tios Ivone e Pedro. Quando criança, também colocava em prática seu lado
escritora e atriz, e costumava escrever peças e organizar teatros para as
crianças da vizinhança, e sempre tendo como repertório de suas criações as
músicas de Vicente Celestino.
Embora
almejasse brilhar nos palcos, sua vida não fora nada fácil: Após concluir o
primário, ela e seus irmãos tiveram que abandonar os estudos e ajudar no
sustento do lar, já que passavam necessidades. Elizeth começou a trabalhar aos
dez anos, e entre os anos de 1930 e 1935 foi
balconista, funcionária de uma fábrica de saponáceos e cabeleireira.
Primeira apresentação
A vida
de Elizeth começou a mudar aos dezesseis anos, quando ela teve sua primeira
festa de aniversário. Nessa época sua família havia se mudado para uma pequena
casa na Rua do Rezende, nº 87, Centro do Rio. Com difíceis condições
financeiras, a família foi morar de favor com a tia Ivone e o marido dela,
Pedro. Sua festa fora realizada nesta casa.
Para a
festa, foram convidados vários amigos de seu pai e de seu tio, também músicos:
Pixinguinha, Dilermando Reis, Jacob do Bandolim. Seu tio pedro a
apresentou a Jacob, que pediu que a jovem cantasse para todos na festa, e mesmo
muito tímida, concordou, e todos gostaram muitíssimo. Jacob, impressionado com
a voz da adolescente, que mesmo sem aula já era uma voz sem erros,
profissional, resolveu convidá-la para fazer um teste na Rádio Guanabara e ver
se o dono aprovava. Elizeth fora no dia seguinte, e com louvor, conseguira
passar na prova e eliminar diversas candidatas: Venceu a prova em primeiro
lugar, e assim sua carreira deslanchou: Com apenas um disco gravado, começou a
ganhar um bom dinheiro e ajudar mais sua família.
Seu pai
era contra a exposição da filha, e não queria que ela se tornasse profissional,
mas Elizeth tinha uma gênio muito forte e uma vontade de realizar seus sonhos
maior ainda, e então, mesmo contra a vontade dele, realizou sua primeira
apresentação em 1936 no Programa Suburbano, ao
lado de Vicente Celestino, Araci de Almeida, Moreira da Silva, Noel Rosa e Marília Batista.
Na semana seguinte foi contratada para um programa semanal na rádio e a partir
daí, nunca mais parou de fazer sucesso, gravando um disco atrás do outro.
Vida Pessoal
Com uma
rígida criação, e com constante vigilância do pai e dos irmãos, Elizeth
manteve-se obediente e só arrumou seu primeiro namorado aos dezesseis anos, o
jogador Leônidas da Silva. Ela se apaixonou ao conhecê-lo numa viagem de
trabalho que fizera, e em poucas semanas de amizade, estavam juntos. Seu pai
fora contra, não queria que a filha namorasse cedo, temia que ficasse mal
falada, e não concordava com sua carreira, pois Elizeth gravava discos e
viajava sozinha, e temia por sua segurança. As brigas se tornaram constantes,
ainda mais quando passou a chegar de manhã em casa, após fazer shows. Ela e o
pai discutiam, e ela não estava mais suportando aquela situação. A decisão de
sair de casa partiu aos dezessete anos, após começar a dormir na casa do
namorado. O pai disse que ia expulsá-la, mas ela por si mesma saiu, e fora
morar com Leônidas, pois ele a havia convidado para viver junto com ele. Seus
pais ficaram muito tristes, pois era considerado vexatório uma moça sair de
casa para morar junto sem casar no papel, mas Elizeth tinha a cabeça a frente
do seu tempo, não tinha certeza se queria casar com ele, apenas queria viver o
momento.
Apesar
de tudo, mantinha uma boa relação com os pais, que aceitaram sua vida. Após um
ano de convivência, sua relação com Leônidas começou a dar sinais de desgaste,
pois ele era muito ciumento, a humilhava quando brigavam e já havia traído
Elizeth e ela o perdoado diversas vezes. Com apenas dezoito anos, Elizeth teve
vontade de ser mãe, mas saberia que isso pesaria na sua carreira, e seu marido
disse que não queria ter filhos, não naquele momento. Elizeth repensou e viu
que estava precipitada, porém um grande acontecimento ocorreu em sua vida:
Encontrou uma recém nascida em um cesto em sua porta, e se apaixonou pelo bebê.
A maternidade aflorou em seu coração, e ela disse ao marido que iria adotar a
criança. Ele recusou, e então os dois brigaram muito. Leônidas a mandou
escolher entre ele e a criança. Certa dos seus sentimentos, Elizeth ficou com a
menina, e saiu da casa dele e voltou para a casa dos pais, que té gostaram da
neném, mas pediram para ela deixar em um orfanato, mas Elizeth se recusou.
Um outro
escândalo se abateu sobre a família: Sempre corajosa, Elizeth registrou a
menina como mãe solteira. A batizou de Tereza Carmela Moreira Cardoso. Seus
pais ficaram chocados com essa atitude, mas a jovem cantora lutou de frente
contra todos os preconceitos. Ela deixava a menina com a mãe quando ia cantar,
e em uma de suas apresentações conheceu Ari Valdez, um cavaquinista, comediante e
compositor de música popular brasileira. Assim que se viram, se apaixonaram. Em
poucas semanas que saíram, assumiram o namoro, e com seis meses namorando,
Elizeth saiu da casa dos pais com a filha e foi morar com Ari, mesmo contra a
vontade dos pais, que achavam uma atitude precipitada, pois se conheciam a
pouco tempo, mas Elizeth não os obedeceu. O marido de Elizeth até que até quis
registrar sua filha, mas a cantora não achava certo ele assumir um compromisso
que ela escolheu para sua própria vida. Sem planejar, e em poucos meses morando
juntos, Elizeth engravidou de Ari, ficando emocionada e surpresa. Ari, então,
quis firmar uma família oficial, e a pediu em casamento. Por amá-lo de fato,
Elizeth aceitou, e então, no fim de 1939 casaram-se apenas no civil. Elizeth
passou a assinar Elizeth Cardoso Valdez. Em 1940 deu
à luz ao único filho do casal, Paulo Cezar Cardoso Valdez. A cantora não quis
ter mais filhos devido sua carreira atribulada, com viagens, shows e gravações,
e também ao fato de já ter realizado seu sonho de ser mãe de um casal.
A
relação foi ficando desgastada ao longo dos anos, pois ela tinha pouco tempo
para se dedicar a família, o marido também viajava demais com suas músicas,
além disso era muito ciumento, já havia lhe traído e Elizeth até perdoado, e
com os anos, os dois estavam sempre discutindo, pouco se viam por causa dos
compromissos profissionais, além das desconfianças dele, o que deixava Elizeth
revoltada. Entre tantos compromissos profissionais dessa época, destacam-se os
anos de 1941, quando tornou-se crooner de orquestras, chegando a ser uma das atrações
do Dancing Avenida, que deixou em 1945,
quando se mudou com a família para a Cidade de São Paulo,
onde permaneceu um ano, para cantar no Salão Verde e para
apresentar-se na Rádio Cruzeiro do Sul, no programa Pescando
Humoristas. Ao voltar de São Paulo em 1946,
ficou bem alguns meses com o marido, mas brigas por ciúmes e cobranças
retomaram seu casamento. Cansada de estar sendo humilhada, saiu da casa dele
nesse mesmo ano com os filhos e alugou um apartamento para morar com as
crianças. Ari passou a persegui-la, querendo que ela voltasse, mas ela não o
queria mais. Com raiva, ele entrou na justiça para tomar a guarda do menino,
mas Elizeth gastou até o que não tinha com os melhores advogados para manter o
filho perto de si, e então o juiz decretou compartilhamento da guarda e a
pensão mensal. Em 1947 saiu o divórcio, e Elizeth voltou a assinar seu
nome de solteira, Moreira Cardoso.
Após o
divórcio, onde não quis nada dele para si, somente para a pensão do filho,
voltou a passar por uma situação financeira difícil: Estava sozinha para
sustentar os filhos, principalmente a filha, onde só ela era a responsável.
Além do mais, sem condições de contratar babá e empregada, tinha que fazer
todos os afazeres domésticos e olhar os filhos, então não poderia se ausentar
para viagens a trabalho, e assim teve que recusar convites, e foram diminuindo
suas apresentações. Acabou tendo que deixar os filhos com a mãe para poder
trabalhar, e lhe pagava para isso, mesmo a mãe não querendo. Para o sustento do
lar, gastou suas últimas economias e aprendeu a dirigir, e começou a trabalhar
como uma taxista da noite:Taxi-girl, nas boates do Rio. Ela era chamada para
levar para suas respectivas casas, em segurança, as pessoas que haviam bebido
ou que não tinham carro. Exercia essa atividade nas noites e madrugadas, quando
não tinha shows. Elizeth exerceu essa atividade por mais de dez anos e juntando
dinheiro ao longo desse tempo, pôde enfim comparar sua casa própria.
Frequentadora assídua do Bola Preta, chegou a ser, por vários anos, madrinha do
famoso clube carnavalesco do Centro da Cidade do Rio de Janeiro.
Depois
do divórcio, Elizeth não quis mais se casar, e passou a ter namorados. Ela se
relacionou com os três maestros da música na época: Dedé, Evaldo Rui e Paulo Rosa.
Com todos eles teve namoro longo, que durou mais de dois anos. Assim que se
separou, se envolveu com Dedé, mas após alguns anos juntos, o deixou para
namorar com Evaldo Rui, e após poucos anos de relacionamento, se separou para
ficar com Paulo Rosa, porém Evaldo Rui não aceitou perder Elizeth, e passou a
persegui-la, ameaçá-la, chegando a agredir Paulo. Não aceitava os dois juntos,
morria de ciúmes da ex, e trazia muitas confusões a vida de Elizeth. O ano
de 1954 foi trágico para a cantora:
Cansado de implorar para voltar, e em grande depressão, Evaldo Rui se suicidou,
pois não aguentou a tristeza de ficar longe de Elizeth. Ela se sentiu muito
culpada, ficou horrorizada com o ato cometido por seu ex, e ficou bastante
depressiva, o que abalou tanto seu emocional, que teve uma crise a apendicite
aguda, tendo que ser operada as pressas.
Em 1966,
após muitos anos namorando com Paulo, se separam amigavelmente, quando ela se
envolveu com o compositor Cyro Monteiro. Após meses de namoro decidiram gravar
um LP juntos. Cyro arrumou alguns shows para Elizeth, que ela não aceitou, por
causa dos baixos cachês. O cantor ficou revoltado, a acusando de ingrata, já
que ele fez um favor para ela, e Elizeth o acusava de jogar tudo na cara dela.
Cyro ficou mais magoado quando, na capa do LP, viu que sua foto era menor que a
dela. Os dois discutiram muito, e Elizeth o acusou de infantil, por brigar com
ela por uma simples foto, e então, terminou o namoro. Esse incidente ainda
atiçou a rivalidade entre Elizeth e Elis Regina, que se meteu numa briga do
casal, e defendeu o amigo Cyro Monteiro. Revoltada, Elizeth brigou com Elis em
público, e disse: "Se você não quer me respeitar como cantora, não precisa
respeitar. Mas exijo que me respeite como mulher. Tenho idade para ser sua
mãe!"
Em 1969 passou
por um grande sofrimento, ao perder sua mãe. Já havia perdido o pai poucos anos
antes, e agora sem sua mãe, sua dor aumentara significativamente. Por causa do
sepultamento de sua mãe, não pode receber das mãos do então governador Negrão
de Lima, o prêmio Estácio de Sá. Recebeu a estatueta de melhor cantora oito
dias depois, num jantar pago pelo Governo do Rio de Janeiro em uma churrascaria
de alto luxo. Nessa ocasião, um estúdio musical foi batizado com seu nome.
Os anos
foram passando. Elizeth ganhou netos e bisnetos. Viu seus irmãos casarem, seus
sobrinhos crescer, ganhou sobrinhos-netos, e vivia feliz, apesar de morar
sozinha, mas sempre mantinha seu coração ocupado com uma grande paixão. Durante
muitos anos namorou atores, cantores e compositores do Rio, ou vivenciava
romances em alguma viagem que fazia nacional ou internacional.
Apesar
de ter viajado o mundo, e cantado em todos os países, só faltava um, que era
seu sonho conhecer: O Japão. No fim dos anos 70
o viu pela primeira vez e ficou encantada. Passou a cantar lá com frequência, e
passou a viajar a turismo, visitando diversas cidades.
Em 1987 recebeu
o convite para uma excursão musical no Japão. Após o término dos espetáculos,
ficou algumas semanas passeando pelo país, quando, hospedada no seu hotel,
Elizeth se sentiu muito mal, com tonteiras, dores estomacais, até que vomitou
sangue e desmaiou. Um dos funcionários do hotel a achou caída, e a cantora
acabou sendo internada as pressas. Rapidamente, após uma endoscopia ultra moderna e rápida, os
médicos japoneses diagnosticaram um câncer no estômago, ou seja, um carcinoma gástrico,
que obrigou a cantora a uma cirurgia emergencial, para conter o sangramento e
diminuir o tumor. Seus filhos foram visitá-la, e após algumas semanas
internada, pôde voltar ao Brasil, acompanhada
deles. Ela passou a se tratar com um gastroenterologista. Apesar tomar medicamentos
e fazer os mais avançados tratamentos contra a doença, o tumor havia diminuído
mas pouco tempo depois havia crescido mais, e se espalhado, e Elizeth passou os
últimos três anos de vida a base de muitos medicamentos, havia sofrido muita
perda de peso, além de fortes dores estomacais e abdominais, mas não deixava se
abater, apesar de descansar mais, se alimentar melhor e cancelar muitos shows,
não conseguia ficar longe do que amava: A música. Quando conseguia ter forças
para andar, com ajuda, subia ao palco e fazia shows, e muitas vezes não
conseguia ir até o final, mas o público era compreensivo. Não suportando mais
tanto sofrimento, e já internada, a cantora faleceu às 12h28min, do dia 7 de
maio de 1990, na Clínica Bambina, no bairro
de Botafogo.
Elizeth Cardoso foi velada no Teatro João Caetano,
onde compareceram milhares de fãs. Foi sepultada, ao som de um surdo
portelense, no Cemitério da Ordem do Carmo, no Caju .
Estilo
Além
do choro, Elizeth consagrou-se como uma das
grandes intérpretes do gênero samba-canção (surgido na década de 1930), ao lado de Maysa, Nora Ney, Dalva de Oliveira, Ângela Maria e Dolores Duran. O gênero, comparado ao bolero, pela exaltação do tema
amor-romântico ou pelo sofrimento de um amor não realizado, foi chamado também
de dor-de-cotovelo ou fossa. O samba canção antecedeu o
movimento da bossa nova (surgido
ao final da década de 1950, 1957).
Elizeth
migrou do choro para o samba-canção e deste para a bossa nova gravando em 1958 o
LP Canção do Amor
Demais, considerado
axial para a inauguração deste movimento, surgido em 1957. O antológico LP
trazia ainda, também da autoria de Vinícius de Moraes e Tom Jobim, Chega de
Saudade, Luciana, As Praias Desertas e Outra Vez. A melodia
ao fundo foi composta com a participação de um jovem baiano que tocava o violão
de maneira original, inédita: o jovem João Gilberto.
Anos 1960
Em 1960,
gravou jingle para a campanha
vice-presidencial de João Goulart. Nos anos 1960 apresentou o programa de
televisão Bossaudade (TV Record, Canal 7, São Paulo).
Em 1968 apresentou-se num espetáculo que
foi considerado o ápice da carreira, com Jacob do Bandolim, Época de Ouro e Zimbo Trio, no Teatro João Caetano, em
benefício do Museu da Imagem e do Som (MIS -
Rio de Janeiro). Considerado um encontro histórico da música popular brasileira,
no qual foram ovacionados pela platéia; long-plays (Lps) foram lançados em
edição limitada pelo MIS. Em abril de 1965 conquistou
o segundo lugar na estréia do I Festival
de Música Popular Brasileira (TV Record) interpretando Valsa do amor
que não vem (Baden Powell e Vinícius de Moraes);
o primeiro lugar foi da novata Elis Regina, com Arrastão. Serviu
também de influência para vários cantores que viriam depois, sendo uma das principais
a cantora Maysa.
Elizeth
Cardoso lançou mais de 40 LPs no Brasil e gravou vários outros em Portugal, Venezuela, Uruguai, Argentina e México.
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