Filha do professor de matemática Faustino Magalhães da Silveira e da
pianista Maria Lídia da Silveira, Nise era bastante estudiosa e foi admitida na
Faculdade de Medicina da Bahia aos 21 anos.
Dedicou sua vida à psiquiatria e manifestou-se radicalmente contrária às
formas agressivas de tratamento de sua época, tais como o confinamento em
hospitais psiquiátricos, eletrochoque, insulinoterapia e lobotomia
Formação
Sua formação básica realizou-se em um colégio de freiras,
na época exclusivo para meninas, o Colégio Santíssimo Sacramento, localizado
em Maceió.
Seu pai foi jornalista e diretor do "Jornal de Alagoas".
De 1926 a 1931 cursou a Faculdade de Medicina da Bahia,
onde se formou como a única mulher entre os 157 homens daquela turma. Está
entre as primeiras mulheres no Brasil a se formar em Medicina. Casou-se
nessa época com o sanitarista Mário Magalhães da Silveira, seu colega de turma
na faculdade, com quem viveu até seu falecimento em 1986. O casal não teve
filhos, por um acordo entre ambos, que queriam dedicar-se intensamente a
carreira médica. Em seu trabalho médico, Mário publicava artigos onde apontava
as relações entre pobreza, desigualdade,
promoção da saúde e prevenção da doença no
Brasil.
Em 1927,
já casada e formada, e órfã de mãe, sofreu pelo falecimento de seu pai, e
então, após alguns meses, junto ao marido, se mudaram para o Rio de
Janeiro, onde teriam mais oportunidades de trabalho. Na então
capital do Brasil, Nise se engajou nos meios artístico e literário, voltados
para área médica, com diversas publicações dos avanços da medicina.
Em 1933,
cursando os anos finais da especialização em psiquiatria, estagiou na clínica neurológica de Antônio Austregésilo. Logo após terminar
sua especialização, foi aprovada no mesmo ano em um concurso de psiquiatria, e
começou a trabalhar no Serviço de Assistência a Psicopatas e Profilaxia Mental
do Hospital da Praia Vermelha.
Nos anos 1930, militou no Partido Comunista Brasileiro e foi
uma das poucas mulheres a assinar o "Manifesto dos trabalhadores
intelectuais ao povo brasileiro". No entanto, acabou por ser expulsa de
sua célula, sob a acusação de trotskismo.
Prisão
Durante a Intentona Comunista foi denunciada por uma
enfermeira pela posse de livros marxistas.
A denúncia levou a sua prisão em 1936 no presídio Frei
Caneca por 18 meses. Nesse presídio também se encontrava preso Graciliano
Ramos, com o que ela tornou-se uma das personagens de seu
livro Memórias do Cárcere.
De 1936 a 1944 permaneceu
com seu marido na semi-clandestinidade, afastada do serviço público por
razões políticas. Durante seu afastamento fez uma profunda leitura
reflexiva das obras de Spinoza, material publicado em seu livro Cartas a
Spinoza em 1995.
Centro
Psiquiátrico do Engenho de Dentro
Em 1944 foi
reintegrada ao serviço público e iniciou seu trabalho no
Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II, no Engenho de
Dentro, no Rio de Janeiro, onde retomou sua luta contra as técnicas
psiquiátricas que considerava agressivas aos pacientes.
Por sua discordância com os métodos adotados nas enfermarias,
recusando-se a aplicar eletrochoques em pacientes, Nise da Silveira foi
transferida para o trabalho com terapia ocupacional, atividade então
menosprezada pelos médicos. Assim, em 1946 fundou naquela
instituição a "Seção de Terapêutica Ocupacional".
No lugar das tradicionais tarefas de limpeza e manutenção que
os pacientes exerciam sob o título de terapia ocupacional, ela criou ateliês de pintura e modelagem com
a intenção de possibilitar aos doentes reatar seus vínculos com a realidade através
da expressão simbólica e da criatividade, revolucionando a Psiquiatria então
praticada no país.
O Museu de Imagens do Inconsciente
Em 1952,
ela fundou o Museu de Imagens do Inconsciente,
no Rio de Janeiro, um centro de estudo e pesquisa
destinado à preservação dos trabalhos produzidos nos estúdios de
modelagem e pintura que criou na instituição, valorizando-os como documentos
que abriam novas possibilidades para uma compreensão mais profunda do universo
interior do esquizofrênico.
Entre outros artistas-pacientes que criaram obras incorporadas na coleção
dessa instituição, podem ser citados Adelina Gomes, Carlos Pertuis, Emygdio de
Barros e Octávio Inácio.
Esse valioso acervo alimentou a escrita de seu livro "Imagens do
Inconsciente", filmes e exposições, participando de exposições
significativas, como a "Mostra Brasil 500 Anos".
Entre 1983 e 1985 o cineasta Leon Hirszman realizou
o filme "Imagens do Inconsciente", trilogia mostrando obras
realizadas pelos internos a partir de um roteiro criado
por Nise da Silveira.
A Casa das Palmeiras
Poucos anos depois da fundação do museu, em 1956, Nise desenvolveu
outro projeto também revolucionário para sua época: criou a Casa das Palmeiras, uma
clínica voltada à reabilitação de antigos pacientes de instituições
psiquiátricas.
Nesse local podiam diariamente expressar sua criatividade, sendo tratados
como pacientes externos numa etapa intermediária entre a rotina hospitalar e
sua reintegração à vida em sociedade.
O auxílio dos animais aos pacientes
Foi uma pioneira na pesquisa das relações emocionais entre pacientes e
animais, que costumava chamar de co-terapeutas.
Percebeu essa possibilidade de tratamento ao observar como melhorou um
paciente a quem delegara os cuidados de uma cadela abandonada no hospital, tendo
a responsabilidade de tratar deste animal
como um ponto de referência afetiva estável em sua vida.
Ela expôs parte deste processo em seu livro "Gatos, A Emoção de
Lidar", publicado em 1998.
Pioneira da psicologia junguiana no Brasil
Por intermédio do conjunto de seu trabalho, Nise da Silveira introduziu e
divulgou no Brasil a psicologia junguiana.
Interessada em seu estudo sobre os mandalas,
tema recorrente nas pinturas de seus pacientes, ela escreveu em 1954 a Carl Gustav
Jung, iniciando uma proveitosa troca de correspondência.
Jung a estimulou a apresentar uma mostra das obras de seus pacientes, que
recebeu o nome "A Arte e a Esquizofrenia", ocupando cinco salas no
"II Congresso Internacional de Psiquiatria", realizado em 1957, em Zurique.
Ao visitar com ela a exposição, ele orientou-a a estudar mitologia como
uma chave para a compreensão dos trabalhos criados pelos internos.
Nise da Silveira estudou no "Instituto Carl Gustav Jung" em dois
períodos: de 1957 a 1958, e de 1961 a 1962. Lá recebeu supervisão em psicanálise de Marie-Louise von Franz, assistente de
Jung.
Retornando ao Brasil após seu primeiro período de estudos junguianos,
formou em sua residência o "Grupo de Estudos Carl Jung",
que presidiu até 1968.
Escreveu, dentre outros, o livro "Jung: vida e obra", publicado
em primeira edição em 1968.
Reconhecimento internacional
Foi membro fundadora da Sociedade Internacional de Expressão
Psicopatológica ("Societé Internationale de Psychopathologie de
l'Expression"), sediada em Paris.
Sua pesquisa em terapia ocupacional e o entendimento do processo
psiquiátrico por meio das imagens do inconsciente deram origem a diversas
exibições, filmes, documentários, audiovisuais, cursos, simpósios, publicações
e conferências.
Em reconhecimento a seu trabalho, Nise foi agraciada com diversas
condecorações, títulos e prêmios em diferentes áreas do conhecimento, entre
outras:
·
"Ordem
do Rio Branco" no Grau de Oficial, pelo Ministério das Relações Exteriores
(1987)
·
"Prêmio
Personalidade do Ano de 1992", da Associação Brasileira de Críticos de
Arte
·
"Medalha
Chico Mendes", do grupo Tortura Nunca Mais (1993)
·
"Ordem
Nacional do Mérito Educativo", pelo Ministério da Educação e do Desporto
(1993)
Seu trabalho e idéias inspiraram a criação de museus, centros culturais e
instituições terapêuticas, similares às que criou, em diversos estados do
Brasil e no exterior, por exemplo:
·
o
"Museu Bispo do Rosário", da Colônia Juliano
Moreira (Rio de Janeiro)
·
o
"Centro de Estudos Nise da Silveira" (Juiz de Fora, Minas Gerais)
·
o
"Espaço Nise da Silveira" do Núcleo de Atenção Psicossocial (Recife)
·
o
"Núcleo de Atividades Expressivas Nise da Silveira", do Hospital
Psiquiátrico São Pedro (Porto Alegre, Rio Grande do
Sul)
·
o
"Centro de Estudos Imagens do Inconsciente", da Universidade do Porto
(Portugal)
·
o
"Museo Attivo delle Forme Inconsapevoli" (hoje renomeado
"Museattivo Claudio Costa", Genova, Itália)
O antigo "Centro Psiquiátrico Nacional" do Rio de Janeiro recebeu
em sua homenagem o nome de "Instituto Municipal Nise da Silveira".
Em 2015, foi incluída na lista das Grandes mulheres que marcaram a
história do Rio".
Obras
publicadas
·
SILVEIRA,
Nise da. Jung: vida e obra. Rio de Janeiro: José Álvaro Ed. 1968.
·
SILVEIRA,
Nise da. Imagens do inconsciente. Rio de Janeiro: Alhambra,
1981.
·
SILVEIRA,
Nise da. Casa das Palmeiras. A emoção de lidar. Uma experiência em
psiquiatria. Rio de Janeiro: Alhambra. 1986.
·
SILVEIRA,
Nise da. O mundo das imagens.São Paulo: Ática, 1992.
·
SILVEIRA,
Nise da. Nise da Silveira. Brasil, COGEAE/PUC-SP 1992.
·
SILVEIRA,
Nise da. Cartas a Spinoza. Rio de Janeiro: Francisco Alves.
1995.
· SILVEIRA,
Nise da. Gatos - A Emoção de Lidar. Rio de Janeiro: Léo
Christiano Editorial, 1998.
Morte
Devido a idade avançada, foi acometida por pneumonia, falecendo de
insuficiência respiratória aguda, no Hospital Miguel Couto, Zona Sul do Rio.
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