sexta-feira, 19 de maio de 2017

O PEQUENO PRÍNCIPE - 5

Eu havia aprendido um segundo fato de grande importância: que o planeta de onde o pequeno príncipe veio era pouco maior do que uma casa!
Mas isto não me surpreendeu tanto assim. Eu sabia muito bem que para além dos grandes planetas para os quais demos nomes – como a Terra, Júpiter, Marte ou Vênus –, havia ainda centenas de outros planetoides, alguns deles tão pequenos que era difícil observá-los pelo telescópio.
Quando um astrônomo descobre um desses planetinhas, ele não lhe dá um nome, mas apenas uma espécie de código numerado. Ele poderia chamar um deles, por exemplo, de “asteroide 325”.


            Eu tenho razões muito sérias para crer que o planeta de onde veio o pequeno príncipe é o asteroide conhecido como B-612.
Tal asteroide só foi visto uma única vez pelo telescópio. Quem realizou o feito foi um astrônomo turco, em 1909.


            Após o feito, o astrônomo apresentou sua descoberta no Congresso Internacional de Astronomia, numa grande demonstração. Mas como ele usava roupas tradicionais da Turquia, ninguém acreditou no que ele disse.
As pessoas grandes são assim...  

Felizmente, no entanto, para a reputação do asteroide B-612, um ditador turco decretou uma lei que obrigava o seu povo a se vestir no estilo europeu, sob pena de morte para quem a desobedecesse.
Então, em 1920, o astrônomo fez novamente a sua apresentação, desta feita vestido com todo o estilo e elegância. E desta vez todos aceitaram a sua descoberta.


            Se eu lhe dou tantos detalhes sobre esse asteroide, e ainda lhe trago o seu código numerado, é somente por conta das pessoas grandes e dos seus costumes.
Quando você diz a elas que fez um novo amigo, elas nunca lhe fazem perguntas sobre o que realmente importa saber. Elas nunca lhe dizem, “Como é o som da sua voz? Quais os jogos de que ele mais gosta? Por acaso seu novo amigo coleciona borboletas?”
Ao invés disso, elas querem logo saber, “Qual a idade dele? Quantos irmãos e irmãs ele tem? Ele é gordo? Quanto dinheiro tem o pai dele?”
É somente por estas últimas perguntas inúteis que elas acreditam que aprenderam tudo sobre o seu novo amigo...  

Se acaso você fosse dizer as pessoas grandes, “Eu vi uma bela casa de tijolos rosados, com flores na beirada das janelas e várias pombas no telhado”, elas não conseguiriam ter qualquer ideia de como seria a casa. Você teria de dizer a elas, “Eu vi uma casa que custa uns 300 mil reais”, e só então elas teriam noção e exclamariam, “Nossa, que bela casa deve ser!”
Assim, se você lhes disser, “A prova de que o pequeno príncipe existiu é que ele era encantador, divertido, e que estava à procura de um carneiro. Caso alguém, qualquer um, esteja em busca de um carneiro, esta é a prova de que ele existe”, de que isso adiantaria para lhes convencer?
Elas iriam dar de ombros e lhe tratar como uma criança. Mas se você disser a elas, “O planeta de onde ele veio é o asteroide B-612”, daí eles se convenceriam, e lhe deixariam em paz.
As pessoas grandes são assim...
            Isto não é motivo para lhes querer mal. As crianças devem sempre mostrar grande tolerância para com as pessoas grandes. Para nós, porém, que compreendemos a vida, tais códigos numerados não têm nenhum significado.
Eu gostaria de ter iniciado esta história à moda dos contos de fadas. Eu gostaria de ter começado com algo como: “Era uma vez um pequeno príncipe que vivia num planetinha um pouco maior do que ele próprio, e que estava em busca de um amigo...”
Para aqueles que compreendem a vida, este trecho inicial daria um ar de credibilidade bem maior para a minha história.  

Pois eu não quero que ninguém leia o meu livro de qualquer jeito, pulando páginas e parágrafos. Eu tive de passar por imensa tristeza para recuperar essas lembranças. Já se passaram seis anos desde que meu amigo se foi, com o seu carneiro. E se eu tento descrevê-lo aqui, é para me certificar de que eu não o esquecerei.
Esquecer um amigo é algo um tanto triste. Nem todos já tiveram um amigo. E ademais, se eu esquecê-lo, corro o risco de me tornar como as pessoas grandes, que já não se interessam por mais nada além dos seus códigos numerados...  

Foi por conta disso, também, que eu comprei uma caixa de tintas e alguns lápis. É complicado voltar a desenhar na minha idade, quando nunca desenhei nada além de jiboias abertas e fechadas, desde os meus seis anos.
Eu certamente tentarei fazer os meus retratos tão próximos da realidade quanto me for possível. Mas eu não estou assim tão certo do meu sucesso. Um desenho pode ficar legal, enquanto outro pode ficar um tanto distante do modelo real. Às vezes também cometo alguns erros quanto à altura do pequeno príncipe: num desenho ele está muito alto, e noutro, muito baixo. E ainda tenho algumas dúvidas acerca da cor da sua roupa.
Dessa forma eu vou me arriscando nos traços, o melhor que posso, e alguns saem bons, outros maus, e tenho a esperança de que no geral eu consiga manter uma boa média.
Em alguns detalhes mais importantes eu também posso cometer deslizes, mas isto é algo de que não posso me considerar culpado. Meu amigo nunca me explicava nada. Talvez ele pensasse que eu era como ele...

Mas eu não sei como enxergar carneiros através dos contornos de uma caixa. Quem sabe eu já não seja um pouco parecido com as pessoas grandes. Afinal, o tempo passou, e eu envelheci.

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