segunda-feira, 29 de maio de 2017

No ano em que Saint-Exupéry nasceu, falecia a Rainha Vitória


MONARCAS E ANARQUISTAS

            A monarquia, abandonada havia muito nos Estados Unidos, estava presente em aproximadamente todos os lugares, com exceção das Américas. O czar da Rússia detinha quase todo o poder, enquanto na Alemanha e no Império Austro-Húngaro os imperadores geralmente eram mais poderosos do que os parlamentos em questões de política externa. O rei da Itália respeitava o parlamento, mas acreditava dispor do direito de passar por cima dele algumas vezes. A rainha da Inglaterra, que governava mais de um quarto dos povos do mundo, era praticamente a monarca menos poderosa da Europa. Ela aconselhava, mas raramente decidia.
           
            Um sinal marcante do prestígio da monarquia foi o funeral dessa rainha. Ela morreu na Ilha de Wight, em um de seus palácios, à tarde, na terça-feira de 22 de janeiro de 1901. Seu desejo era ter um funeral militar, uma vez que era a chefe das forças armadas e da marinha do Império Britânico. Seu caixão, coberto com cetim branco, foi transportado no iate real até a base naval de Portsmouth, atravessando todo o trecho de quase 15 quilômetros em um corredor formado por embarcações - os couraçados e cruzadores britânicos ancorados de um lado; as canhoneiras, os transatlânticos e os navios de nações estrangeiras amigas de outro. Oito destróieres, pintados de preto para a ocasião, acompanharam o iate real, e as pessoas a bordo ouviram, ressoando sobre o mar, a Marcha Fúnebre de Chopin, tocada por bandas nas embarcações.

           
            No dia seguinte, o caixão real, transportado até Londres pelo trem funerário, passou por estações apinhadas de pessoas em luto, enquanto nos campos os trabalhadores rurais podiam ser vistos sob a chuva forte, sem chapéu, em sinal de respeito. Praticamente todos os que assistiam ao cortejo haviam passado a vida inteira sob o reinado daquela monarca. Na cidade de Londres, a procissão fúnebre avançou lentamente em direção à estação de Paddington, observada em silêncio por uma imensa multidão. Destacavam-se no cortejo fúnebre, todos  montados em cavalos, o rei de Portugal, que logo seria destronado, o arquiduque Franz Ferdinand, que seria assassinado às vésperas da Primeira Guerra Mundial, e o imperador alemão, que perderia o trono ao fim dessa guerra.
           
            Na Europa, as monarquias viviam o apogeu, mas na África eram cada vez mais escassas. A família real de Madagáscar havia sido enviada ao exílio pelos franceses em 1897, e o sultão de Zanzibar submetera-se à autoridade real britânica. As poucas regiões independentes que restavam na Ásia tinham seus monarcas. China, Japão, Coreia e Tailândia eram monarquias e até a Índia possuía um monarca, embora ausente, uma vez que a rainha da Inglaterra carregava o título de imperatriz da Índia; príncipes, nizans, rajás e outros potentados reais permaneciam com as asas cortadas. Nas ilhas do Pacífico, também havia monarquias, mas Tonga é a única que mantém até hoje esse sistema de governo.

           
Assassinato do Presidente da França,
 Marie François Sadi Carnot
Na Europa, os monarcas tinham um terrível inimigo: os anarquistas.
            Presentes na Itália, na França e na Espanha e outrora aliados dos socialistas, consideravam os soberanos poderosos um problema, não uma solução. A maioria dos anarquistas não acreditava em parlamentos, desprezava a propriedade privada e guardava rancor dos líderes nacionais. De acordo com seu ponto de vista, todos tinham o direito de compartilhar o poder e a riqueza. Sua primeira arma era, literalmente, a anarquia.
           
            Greves gerais, extremamente perturbadoras, eram uma das armas dos anarquistas; o assassinato de líderes nacionais era outra. Seus membros mais radicais - então já chamados de terroristas - se dispunham a morrer pela causa, da mesma maneira que os terroristas islâmicos fariam um século mais tarde. Em 1894, o presidente frances Carnot viajava de carruagem em Lyon quando um conhecido anarquista italiano lançou-se sobre ele e o apunhalou. Em 1897, o premier espanhol Canovas dei Castillo passava um feriado no balneário de Santa Aguada quando foi morto a tiros por um anarquista italiano, em pleno dia. Em 1898, a imperatriz da Áustria passeava incógnita pelas ruas de Genebra - um ato inacreditável para a monarca de uma das cinco grandes potências do mundo - quando foi morta a punhaladas por um anarquista também italiano.
           
           
Assassinato do Premier Espanhol
O popular rei Humberto, da Itália, quase foi assassinado em Roma, no ano de 1897. Três anos mais tarde, em Monza, perto de Milão, os anarquistas o mataram. Também em 1900, em Paris, o Xá da Pérsia foi atacado durante uma visita à cidade, enquanto na Bélgica o herdeiro do trono britânico foi atacado por um jovem anarquista - por pouco não existiria um Edward VII, título assumido após a morte da rainha Vitória, um ano mais tarde. Em 1901, o presidente dos Estados Unidos, William McKinley, foi morto por um anarquista. Como os assassinos tinham de agir muito perto das vítimas, praticamente não havia como fugir em seguida: a morte era a punição deles. Eram os equivalentes aos atuais homens-bomba.
           
            O terrorismo é uma velha atividade que aparece, desaparece e reaparece. Quando uma nova onda de terrorismo atingiu a Europa e o Oriente Médio durante a segunda metade do século 20, os anarquistas, com suas pistolas e facas, já haviam desaparecido da memória das pessoas.

            

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